top of page

O despertar do tigre: curando o trauma.

  • Foto do escritor: Cláudia Casavecchia
    Cláudia Casavecchia
  • 25 de abr.
  • 3 min de leitura

“Não seremos capazes de entender profundamente ou de curar o trauma sem que o corpo e a mente sejam acessados conjuntamente como uma unidade”.


A Somatic Experiencing é um método desenvolvido pelo psicólogo americano Peter Levine há mais de 25 anos. O autor se baseou no estudo da biologia animal e compreendeu que a cura do trauma se processa através da integração corporal. Para isso, foi preciso compreender o complexo funcionamento das respostas instintivas em nosso organismo.


Para ele, o transtorno do estresse pós-traumático não é uma patologia que deve ser reduzida ao gerenciamento ou à supressão, mas o resultado de um processo natural do corpo, distorcido pela experiência traumática. Ele afirma que: “a cura do trauma exige uma experiência direta do organismo que vive, sente e conhece”. Assim, é preciso compreender de que forma os sintomas foram criados, como reconhecê-los, experimentando como agem os instintos.


A SE não foi submetida a nenhuma pesquisa científica rigorosa, mas seu fundador afirma que o que sustenta seu trabalho é a experiência das várias centenas de pessoas que resgataram uma vida plena e satisfatória, tendo seus sintomas superados ou significativamente diminuídos.


No que consiste o trauma? Como começam os sintomas pós-traumáticos? Como se desenvolvem? Por que são tão fortes e persistentes? Para além dos mitos a respeito do trauma, Levine nos conduz ao entendimento acerca dos processos fisiológicos básicos que o produzem, através de uma descrição simples e coerente.


Na perspectiva adequada do que significa organismo, é preciso vislumbrar o sentido de unicidade. Há diversos sistemas e aspectos de um organismo que trabalham sistemicamente: ossos, músculos, substâncias químicas, órgãos, instintos, emoções, intelecto, espiritualidade, etc. O instrumento que possuímos para experimentar a nós mesmos enquanto organismo é a sensopercepção.


Sensopercepção é o processo pelo qual captamos e interpretamos estímulos do ambiente através dos sentidos (visão, audição, olfato, paladar, tato, propriocepção e movimento), formando uma experiência consciente da realidade, nos conectando ao mundo e constituindo a base da nossa vivência cotidiana. Ela envolve dois momentos principais:


1. Sensação: é a captação pura do estímulo pelos órgãos sensoriais (como ver uma cor, ouvir um som ou sentir uma textura).


2. Percepção: é a interpretação que o cérebro faz dessa sensação, dando-lhe sentido e contexto (reconhecer um rosto, identificar uma música, perceber se algo é quente ou frio).


A informação sobre o trauma (Trauma-Informed Care) nos auxilia a desenvolver um senso de confiança em nosso próprio organismo, tornando-se pertinente a nível pessoal e social, já que a esfera traumática envolve o âmbito mundial há muitas gerações, transcorrendo no processo traumático-intergeracional. Já sabemos hoje que os efeitos do trauma não processados e elaborados são transmitidos geneticamente.


Para trabalhar com técnicas corporais em terapia, o profissional deve ter, além de formações específicas, conhecimento apurado de seu próprio corpo, possuindo também um background suficiente em fisiologia, como afirma o autor. A experiência da sensopercepção não se trata de uma vivência catártica, onde o indivíduo revive o trauma, já que tais processos de ab-reação podem ser retraumatizantes, ao invés de curativos.


Levine aponta três tipos de trauma:


1. Trauma de choque

2. Trauma de desenvolvimento

3. Trauma intergeracional


O primeiro refere-se ao choque provocado por experiências potencialmente ameaçadoras à vida (material ou simbólica) e que superam a capacidade do organismo de responder com eficácia. O segundo corresponde a questões de base psicológica que geralmente resultam de cuidado e orientação inadequados durante o desenvolvimento infantil. Acrescenta o autor: “embora as dinâmicas que os produzem sejam diferentes, a crueldade e a negligência podem resultar em sintomas que são semelhantes e com frequência entrelaçados com os do choque traumático".

(LEVINE, 1999, p. 22)


No trabalho corporal para o processamento traumático, a sensação corporal é mais importante que a emoção intensa, tornando-se a chave para a superação do trauma. Se durante o processo qualquer emoção surgir de maneira expansiva demais, como fúria, terror ou impotência profunda, além do auxílio de um profissional qualificado para oferecer continência e conduzir a experiência, é importante observar como tais emoções se refletem no corpo, mantendo a consciência nesse aspecto sensorial do percurso.


O autor enfatiza ainda que o trauma não precisa ser uma condenação e apesar de seus efeitos se assemelharem ao inferno na Terra, o trauma resolvido é um dos deuses — uma jornada heroica que pertence a cada um de nós.



Claudia Casavecchia


LEVINE, Peter. O despertar do tigre: curando o trauma. São Paulo: Summus, 1999.

 
 
 

Posts recentes

Ver tudo
O nervo vago e a autorregulação emocional

“Embora possamos pensar que nossos cérebros estão no comando, o coração de nossa experiência diária e a maneira como navegamos pelo mundo começam em nossos corpos, com o sistema nervoso autônomo. É no

 
 
 

Comentários


Post: Blog2_Post

Endereço

Rua: Ibitirama, 166. Sala 308. Ao lado do metro Vila Prudente.

©2021 por DIALETICAMENTE DESENVOLVIMENTO HUMANO E EVOLUÇÃO DA CONSCIÊNCIA LTDA | CNPJ: 60.748.512/0001-62

bottom of page